André Figueiredo Rodrigues
apresentou-se agradecendo pela oportunidade concedida a um paulista que se
apaixonou por Minas Gerais. Lembrou que na infância sentiu-se tocado pela
comoção nacional em torno do falecimento de Tancredo Neves e, perguntando a um
tio o motivo, recebeu como resposta a sugestão de ler um livro publicado em
1902 sobre Tiradentes. Na adolescência buscou outras informações sobre o
alferes e mesmo tendo feito a primeira opção por outro curso universitário, o
desejo paulista de conhecer a própria terra levou-a a visitar as cidades
históricas e à decisão de estudar a vida dos inconfidentes, trajetória que já
se estende por 12 anos.
Mencionou a ideia corrente de que
a fortuna dos inconfidentes foi para a Coroa, em volume considerável de ouro.
Entretanto, por conta do que apurou na pesquisa sobre a vida de Ayres Gomes,
questionou tal afirmativa. Analisando a fortuna deixada pelo próprio Ayres Gomes e
por Alvarenga Peixoto, decidiu aprofundar as buscas, encontrando informações
interessantes. Citou como exemplo um porco que, no levantamento da Fazenda
Borda do Campo aparece com o valor de 30 réis e em inventários comuns é
avaliado em 80 réis. Por conta de tais diferenças, após concluir o estudo sobre
Ayres Gomes, resolveu concentrar-se nos outros inconfidentes da Comarca do Rio
das Mortes.
Muito alegre e brincalhão, o
palestrante contou uma piada. Disse que se tornou amigo de Ângelo Carrara e que
dele ouviu um conselho: não adianta querer trabalhar com pobre; melhor
trabalhar com ricos porque deles há fontes documentais. Ou, em linguagem bem
mineira, “rico tem sustança”!
Passou a falar de José de Rezende
Costa, atualmente muito comentado por conta da investigação sobre seus restos
mortais que resultou no esboço da provável aparência de sua face. Citou o Padre
Rolim como outro inconfidente sobre o qual seria possível, também, reconstituir
a face, através de descrições publicadas.
Reconstituição facial de José de Rezende Costa
Fonte: http://museudainconfidencia.wordpress.com
Destacou que Rezende Costa chamou
a sua atenção pela seguinte questão: como a família conseguiu perpetuar o
patrimônio e a Coroa Portuguesa só recebeu um valor irrisório?
Pesquisando sobre este personagem
o palestrante teve oportunidade de descobrir o papel das mulheres, o que o
levou a concluir que os grandes personagens da Inconfidência não são os homens,
mas as mulheres que corrompem, enganam e subornam. Citou o caso da Bárbara
Heliodora que multiplicou por 8, em 3 anos, o que Alvarenga Peixoto levara 20
anos para conseguir.
No caso de Rezende Costa,
ingerências da família resultaram em que nada se perdesse, apesar do cálculo
inicial apontar para um recolhimento de mais de 7 contos de réis em favor da
Coroa. A prisão do patriarca foi tardia, em 1791, sendo necessário esclarecer
que nada foi feito de surpresa e, portanto, os presos tiveram tempo de se
organizarem.
O palestrante mencionou os bens
que foram listados, bem como a avaliação e o resultado do processo que, assim
como no caso de Ayres Gomes, demonstram que a Coroa não recebeu o que
aparentemente lhe seria devido.
Foram projetadas algumas imagens,
incluindo mapas, e ressaltado que não se sabe de fotografia ou desenho com a
aparência da casa sede da propriedade.
Ao discorrer sobre os motivos que
impediram que o sequestro dos bens se efetivasse, ressaltou que, já sabendo de
sua prisão, 40 dias antes o Rezende Costa resolveu transmitir um terço de seu
patrimônio para o genro. Uma semana e meia antes da prisão, foi firmado o
contrato de casamento da filha com Gervásio Pereira Alvim.
O restante do patrimônio
pertencia à esposa e, quando chegou a devassa, apenas 50% dos bens dela
poderiam ser sequestrados. Entretanto, antes de perder os bens há o direito de
precedência de créditos, o que significa que foi possível apresentar à justiça
as cobranças existentes antes da devassa, solicitando que as dívidas fossem
pagas. Neste momento o genro cobra a parcela constante do contrato de
casamento, um irmão de Rezende Costa – Severino Ribeiro cobra uma parte relativa
a um projeto de mineração em que os dois eram sócios, além de sobrinhos e
primos que também aparecem no rol de credores. Não se sabe como aparece,
também, uma certidão solicitando pagamento de dívidas do filho.
Gervásio Pereira Alvim decide,
então, juntar todas as dívidas e pagar aos demais devedores, tornando-se o
único credor do sogro. A sogra, não podendo administrar os bens, transfere o
encargo para Gervásio que se torna o fiel depositário. Oras, quase 80% da
dívida era com ele mesmo! Donde apresenta uma lista de mais de 400 bens
avaliados por ele em mais de três contos. Seria necessário vender os bens para
saldar as dívidas, razão pela qual foram feitas três tentativas de leilão em
que não apareceram interessados. Desta forma, o próprio genro decidiu efetuar a
compra, fazendo-a por preço abaixo do valor originalmente estipulado por ele
mesmo, de forma que mais de 97% dos bens em arresto atingiram o montante
necessário. Já detendo um terço do patrimônio, torna-se, assim, proprietário de
tudo o que pertencia a Rezende Costa.
André Figueiredo mostrou os
valores computados na primeira execução e as dívidas apresentadas, demonstrando
um superávit inicial. Ao serem juntadas as cartas de cobrança do irmão de
Rezende Costa, Pereira Alvim acrescenta mais alguns bens que são levados a
leilão e comprados por ele mesmo. Posteriormente é apresentada nova carta de
cobrança, impetrada por filho ilegítimo de Hipólita Jacinta Teixeira de Melo,
listando despesas futuras do empreendimento de mineração em que era sócio de
Rezende Costa. A liquidação ocorre repetindo o modelo acima mencionado.
Não existem, em outros
inventários consultados, nada comparável aos preços apresentados nas prestações
de contas. Seguindo todo o processo, o palestrante comparou os cálculos de todas
as etapas e a forma como o superávit vai diminuindo até desaparecer por
completo, quase nada restando para a Coroa.
Em 1804, representantes das
famílias dos inconfidentes são chamados pelo fisco para apresentação de contas.
Gervásio Pereira Alvim, então, demonstra que nada há para recolher do
patrimônio de Rezende Costa e que a Coroa teria que arcar com as despesas do
fiel depositário que, como vimos, foi ele mesmo.
Segundo o palestrante, o mesmo
ocorreu com Hipólita Jacinta em Prados e com Ayres Gomes. Sendo que, neste
último caso, um erro de cálculo permitiu que um pequeno valor fosse recolhido
para a Coroa.
O fiel depositário dos bens de
Hipólita Jacinta foi um sobrinho que também resolveu pagar todas as dívidas e
tornar-se o único credor, destacando-se que eram dívidas com parentes próximos,
inclusive filhas do fiel depositário e
escravos que foram alforriados e teriam recebido uma porcentagem do montante.
Chama a atenção o fato de que o
Governador não enfrentou a situação, mesmo tendo havido uma denúncia de desvio
de bens por parte de um parente de Hipólita e as artimanhas para esconder os
escravos de maior valor, sendo apresentados apenas aqueles que não se prestavam
mais ao trabalho. Embora a família tenha sido chamada para prestar
esclarecimentos, em nenhum momento aparecem sinais de apuração ou de
enfrentamento, parecendo indicar que o poder das famílias era superior ao dos
governantes.
Finalizando, citou a lenda sobre
ajuda que teria sido dada a Bárbara Heliodora que estaria em situação difícil,
declarando tratar-se de balela e que o processo ocorrido na região de Campanha
girou em torno de bens desconhecidos no início da devassa.