Marc Bloch é um dos principais autores que guiam nosso projeto de pesquisa. Escolhemos resgatar a memória da Colônia Agrícola Constança através do estudo dos homens e mulheres que habitaram aquele espaço porque, conforme ensina este pensador francês em Apologia da História
"Por trás dos grandes vestígios sensíveis da paisagem [os artefatos ou as máquinas,] por trás dos escritos aparentemente mais insípidos e das instituições aparentemente mais desligadas daqueles que as criaram, são os homens que a história quer capturar. Quem não conseguir isso será apenas, no máximo, um serviçal da erudição".
Antes da chegada em massa dos imigrantes, a vida transcorria dentro de parâmetros estabelecidos há muito tempo. Os proprietários de terra mandavam derrubar a mata, plantar, colher e vender. Com o capital arrecadado, investiam em compra de novos escravos para melhor explorar uma faixa de terra ainda virgem. Buscavam acumular um montante mais significativo que permitisse ampliar a lavoura e garantir-lhes o status. Além das picadas na mata, mandavam abrir ou recuperar caminhos para o trânsito da produção e também para que sua família pudesse se deslocar. Seja para as festas religiosas no centro urbano, seja para as sonhadas viagens à corte, a vida dos fazendeiros girava em torno de garantir a produção e os meios de locomoção que sustentavam um insipiente convívio social.
O comércio mais significativo - venda da produção agrícola - era direcionado para os grandes centros, gerando necessidades que passavam pela compra ou criação de animais de carga até o investimento na estrada de ferro, já no último quartel do século XIX. Já o comércio local era explorado por prepostos dos próprios fazendeiros, em estabelecimentos denominados por "venda", geralmente localizados no entroncamento dos múltiplos caminhos que cortavam as propriedades.
O poder decisório estava nas mãos dos grandes fazendeiros. Embora a literatura romântica se refira a propriedades de grande extensão, os registros indicam poucas fazendas ultrapassando os 400 hectares e um grande número de sítios, entre 10 e 50 alqueires mineiros. Os pequenos proprietários ficavam sujeitos, na maioria das vezes, ao sistema de plantio e comercialização definido pelos grandes.
Chegam os imigrantes colonos e o ritmo é modificado. Não parece ter havido uma ruptura significativa e imediata. Mas os trabalhadores livres nas fazendas já não se contentavam em esperar o beneplácito do contratantes para ascender economicamente. Aos poucos foram negociando novas relações de trabalho, incluindo a parceria. Do pedaço de terra que o fazendeiro destinava a cada colono, começaram a nascer os pequenos roçados, as pequenas produções de gêneros variados. Há relatos de colono que vendia milho para a cozinha da fazenda. E de outro que fabricava móveis para vender na propriedade vizinha. Já não era, portanto, o escravo da fazenda que produzia o sapato, a roupa ou a cama para o "sinhozinho". Instaurou-se uma era de mais liberdade para produzir, vender, acumular capitais e progredir, abrindo a sociedade para a chegada de novos atores. Poucos espaços permaneceram restritos ao uso dos privilegiados descendentes dos fazendeiros.
A Colônia Agrícola da Constança é, pois, consequência de um novo modo de vida. Que foi construído por homens e mulheres, artífices da nova sociedade que se estabeleceu em Leopoldina.